Entrevista feita pelo Jornalista da Divisão Sul-Americana Felipe Lemos com o Pr. Adolfo Suárez.
Uma leitura rápida de textos bíblicos como I Pedro 1:16 pode gerar dificuldades de compreensão. No versículo, é afirmado, da parte de Deus, que devemos ser santos como Ele é santo. Isso leva a reflexões a respeito de conceitos como salvação, perfeição e santidade. A Agência Adventista Sul-Americana de Notícias (ASN) resolveu conversar com o teólogo e reitor do Seminário Adventista Latinoamericano de Teologia (SALT), Adolfo Suárez. Ele é apresentador, também, de um programa que irá ao ar, em abril pela TV Novo Tempo, sobre discussões teológicas. Nessa conversa, ele desmistifica alguns conceitos sobre perfeição e impecabilidade.
O que a Bíblia realmente quer dizer em textos onde Deus pede perfeição ao ser humano ou dá a entender que a perfeição é possível? Está falando da impossibilidade de as pessoas pecarem em determinado momento da sua caminhada espiritual?
Há pelo menos nove diferentes palavras hebraicas e seis palavras gregas traduzidas como perfeição. De Noé, por exemplo, é dito que era “perfeito em suas gerações” (Gênesis 6: 9, NKJV). Tiago afirma que “se alguém não tropeçar no falar, é perfeito varão (3:2). Paulo, por sua vez, afirma: “Falamos sabedoria entre os perfeitos” (1 Coríntios 2:6, ARC).
Nesses e em outros textos não é dito que os seres humanos são sem pecado, mas os versos se referem à maturidade espiritual, ao pleno crescimento espiritual. Assim, um cristão perfeito é aquele cujo coração e mente estão permanentemente comprometidos com Cristo. Se observarmos a história de suas vidas, veremos que eles estavam longe de ser “sem pecado”. De modo que quando Deus pede “perfeição” aos Seus filhos, nunca significa “uma vida sem pecado”.
Parece haver uma constante tensão, nos escritos do Novo Testamento especialmente, entre a graça maravilhosa de Cristo que salva o pecador e a necessidade de obediência à lei e um comportamento religioso aceitável. Como compreender essa aparente tensão?
Não há tensão, mas conexão. A natureza da lei de Deus é amor. A lei foi ofertada para orientar a humanidade a viver de maneira correta e promove bons relacionamentos com Deus e uns com os outros. Isso permite uma vida harmoniosa. É a lei de Deus que mantém os seres humanos livres da escravidão demoníaca. Os cristãos a guardam porque amam a Deus, e a guardam porque foram salvos pela graça. E porque foram salvos pela graça, sentem-se impelidos a viver segundo a vontade do Pai, expressa em Seus Mandamentos.
Haverá objetivamente um momento em que o ser humano, descrito pela cosmovisão bíblica como essencialmente pecador, deixará de pecar e se tornará, de certa forma, como Cristo que nunca pecou?
Os maiores homens e mulheres da Bíblia nunca reivindicaram perfeição sem pecado. Eles tinham plena consciência do fato de que eram pecadores, e permaneceram, assim, ao longo de suas vidas. De modo que o cristão sempre se reconhece como um pecador que necessita da graça divina. A pretensão de possuir uma vida perfeita “sem pecado”, enquanto estivermos neste mundo, é a raiz do orgulho espiritual e da justiça própria. O cristão não nega que a nova vida em Cristo seja capaz de uma nova justiça, de vitória gradual sobre o pecado. Ele apenas insiste que não é sua justiça, não é sua vitória, mas a justiça e vitória de Cristo.
Por que crer em um conceito de perfeição cristã, como impecabilidade, é prejudicial para a visão dos ensinos bíblicos de salvação?
É fatal e errado pensar que, se nos entregarmos totalmente a Cristo, então nossa natureza pecaminosa será erradicada. Afinal, o texto bíblico afirma claramente: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós” (1 João 1:8-10).
Isso significa que a lei do pecado e da morte ainda opera dentro de nós. É algo que permanece em nós enquanto vivemos. Claro que a cada dia vamos amadurecendo em nossa experiência cristã e lutamos pelo desenvolvimento de um caráter mais puro. Só que esta é uma experiência que deve ser mantida dia a dia por meio da comunhão com Cristo e entrega a Ele. Pensar diferente, defendendo a “impecabilidade”, é manifestação de justiça própria e orgulho espiritual. Levada ao extremo, essa atitude pode resultar numa pessoa autossuficiente, crítica, julgadora do próximo, um verdadeiro “patrulheiro dos pecadores”. E esse papel só cabe ao Espírito Santo, porque é Ele quem nos convence do pecado, da justiça e do juízo” (João 16:8). [Equipe ASN, Felipe Lemos]
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