Casamentos pastorais
Willie Oliver, PhD, é diretor do Ministério da Família da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia, Silver Spring, Maryland, Estados Unidos.
Elaine Oliver, MA, é diretora associada do Ministério da Família da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia, Silver Spring, Maryland, Estados Unidos. Atualmente ela está cursando o doutorado em Psicologia Educacional pela Universidade Andrews.
Estamos casados e no ministério há 32 anos. Ficar casados um com o outro e ainda no ministério depois de todo esse tempo tem tudo a ver com a providência e a graça de Deus. A graça de Deus, com certeza, realiza seu melhor trabalho quando aceitamos o dom que Ele oferece e permitimos que esse dom se germine e cresça em nossos corações por meio do poder do Espírito Santo, cuja sugestões escolhemos seguir.
Sejamos francos. O casamento é difícil. Sim, sabemos que o casamento é divertido e todas essas coisas maravilhosas de que falamos com frequência. No entanto, apesar de nossas melhores intenções, a realidade das diferenças que invariavelmente são motivo de grande preocupação na maioria dos casamentos nos mantém de joelhos. A verdade é que encontramos esse tipo de realidade baseados em uma decisão banhada em oração e em sermos intencionais em dar honra e glória a Deus em nosso casamento.
O CASAMENTO PASTORAL
Os casamentos pastorais enfrentam muitos dos mesmos desafios que outros casamentos, e a maioria dos atarefados casais profissionais reproduz compromissos concorrentes semelhantes experimentados por muitos casais pastorais. A principal diferença ocorre quando casais pastorais têm a pressão adicional de viver em um aquário e com grandes expectativas de seus fiéis e empregadores de ser tudo para todas as pessoas. Isso inclui o papel de campeões espirituais em todas as situações, especialmente na maneira como eles discipulam seus filhos para serem verdadeiros seguidores de Jesus Cristo. Além do desafio constante de não ter tempo suficiente para fazer tudo o que têm para fazer, os casais pastorais frequentemente lidam com curtos mandatos e mudanças frequentes, que os afastam de suas ligações próximas com família e amigos, desta forma, perturbando assim seu equilíbrio emocional. Essa experiência é muitas vezes agravada por restrições financeiras, visto que vivemos em um mundo onde viver com um salário é cada vez mais difícil. Especialmente no mundo desenvolvido, a esposa do pastor muitas vezes precisa encontrar um novo trabalho, o que pode incluir muitas semanas e meses com uma interrupção nos salários, acrescentando ansiedade, tensão e trauma a uma situação já estressante. É em tempos como estes que os casais pastorais, como todos os casais casados cristãos, precisam reconhecer que o casamento é ideia de Deus e foi criado para o nosso bem. “Instituído por Deus, o casamento é uma ordenança sagrada, e nunca se deve entrar nele em espírito de egoísmo. Aqueles que pensam em dar esse passo, devem considerar-lhe solenemente e com oração a importância, e buscar conselho divino a fim de saberem se estão seguindo uma direção em harmonia com a vontade de Deus.”1
Embora o casamento tenha sido planejado por Deus para abençoar a família humana, Satanás tentou de tudo para denegrir, depreciar e difamar essa importante instituição. Portanto, espere que seu casamento entre naturalmente em um estado de alienação. A Bíblia diz em Romanos 3:23: “pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus”.2 Isso simplesmente nos lembra que não há casamentos perfeitos, porque não há pessoas perfeitas. Contudo, visto que Deus é mais poderoso que Satanás, todo casamento pode prosperar quando os cônjuges são intencionais em se conectar um com o outro todos os dias por meio do poder e da graça de Deus. Uma citação de um autor desconhecido que frequentemente gostamos de compartilhar diz: “Casar é fácil. Permanecer casado é mais difícil”. Permanecer felizes e casados durante a vida inteira seria considerado uma das belas-artes. Isso é verdade para todos os casamentos e especialmente para os casamentos pastorais que experimentam tantas expectativas internas e externas.
Com certeza, as expectativas surgem de dentro por causa da necessidade de representar bem Jesus. O conceito muitas vezes pode ser visto como a necessidade de fingir ter um casamento perfeito quando você não tem. É claro que quanto mais os casais pastorais se sentem compelidos a apresentar ao público uma imagem que não é real, menos provável é que cumpram esse objetivo por causa do estresse gerado internamente, dada a realidade de nossas fragilidades humanas. A pressão de fora vem de outros, geralmente membros da igreja e, às vezes, de nossas famílias, amigos, colegas e organizações de emprego, que tendem a colocar os pastores e suas famílias em um padrão mais elevado do que o dos seres humanos normais. A fim de superar esses fardos insuportáveis, os casais pastorais devem passar muito tempo em oração, buscando uma relação genuína com Deus e um com o outro.
E por falar na necessidade de permanecer em oração, Romanos 12:12 oferece: “Alegrem-se na esperança, sejam pacientes na tribulação, perseverem na oração”. No entanto, Isaías 65:24 declara: “Antes de clamarem, eu responderei; ainda não estarão falando, e eu os ouvirei”.
E Ellen White nos lembra em seu pequeno livro Caminho a Cristo: “Não há em nossa vida nenhum capítulo demasiado obscuro para que o possa ler; perplexidade alguma por demais intrincada para que a possa resolver. Nenhuma calamidade poderá sobrevir ao mais humilde de Seus filhos, ansiedade alguma lhe atormentar a alma, nenhuma alegria possuí-lo, nenhuma prece sincera escapar-lhe dos lábios, sem que seja observada por nosso Pai celeste, ou sem que Lhe atraia o imediato interesse. Ele ‘sara os quebrantados de coração e liga-lhes as feridas’. Salmos 147:3. As relações entre Deus e cada pessoa são tão particulares e íntimas, como se não existisse nenhuma outra por quem Ele houvesse dado Seu bem-amado Filho”.3
ASSÉDIO DIGITAL
Sobre a questão do tempo como mercadoria nos casamentos pastorais, a tirania proverbial do tempo nunca foi mais real do que a que estamos experimentando hoje. E-mail, Facebook e mensagens de texto, juntamente com inúmeros novos aplicativos que surgem todos os dias, dão acesso onipresente ao nosso tempo para todo mundo, em qualquer lugar, a qualquer hora, criando uma expectativa de recebimento de respostas instantâneas. Cada dia tem apenas 24 horas em que os pastores precisam ter tempo a sós com Deus, visitar os membros, estudar, escrever sermões, participar de reuniões organizacionais, escrever no blog, dar estudos bíblicos, responder a e-mails, interagir nas redes sociais, dormir, comer, fazer exercícios, fazer o culto familiar, e se conectar com familiares e amigos. Após cuidar de todas essas coisas, não apenas temos pouca energia para outra coisa, como também não há tempo significativo para compartilhar com o cônjuge. E se formos realmente honestos um com o outro, na verdade, há muito pouco tempo para passar com Deus em oração, o que significa que acabamos com muito pouco combustível para ter os recursos para um ministério eficaz e real satisfação na vida.
LIMITES
Então, como um casal pastoral cria mais tempo no contexto da vida no terceiro milênio para ter a qualidade de relacionamento que faz a vida realmente valer a pena? A verdade é que, para isso acontecer, limites saudáveis devem ser estabelecidos a fim de sobreviver e prosperar. E limites saudáveis são encontrados no contexto de pessoas emocionalmente inteligentes, que têm um alto nível de autoconsciência, sabendo o que querem realizar no processo. Sobre esse assunto, Daniel Goleman sugere: “A autoconsciência é o primeiro componente da inteligência emocional. […] Autoconsciência significa ter uma compreensão profunda de suas emoções, forças, fraquezas, necessidades e impulsos. […] A autoconsciência se estende à compreensão de uma pessoa sobre seus valores e objetivos. Alguém que é extremamente autoconsciente sabe para onde está indo e por quê. […] As decisões de pessoas autoconscientes combinam com seus valores”.4
A autoconsciência e a inteligência emocional de que falamos aqui não surgem apenas porque temos mais escolaridade ou somos mais inteligentes que todo mundo. Isso ocorre devido a um relacionamento íntimo com Deus e ao nosso desejo de honrá-Lo em nosso relacionamento mais íntimo com nosso cônjuge. Isso se torna o tipo de inteligência emocional que traz paz. Sobre a questão de priorizar e aproveitar ao máximo o tempo, Stephen Covey sugere que “um dos piores sentimentos do mundo é quando você percebe que as ‘primeiras coisas’ em sua vida, incluindo sua família, estão sendo empurradas para segundo ou terceiro lugar, ou ainda mais abaixo na lista. E fica ainda pior quando você percebe o que está acontecendo como resultado”.5
A verdade é que não podemos acrescentar horas ao nosso dia, mas podemos adicionar ordem e prioridade a essas horas para que possamos maximizar o tempo que temos com nosso cônjuge a cada dia, cada semana, cada mês e cada ano para ter o tipo de relacionamento que resistirá ao teste do tempo e dará honra e glória a Deus. Para que as coisas mudem, se essa não tem sido a prioridade de nossas vidas, precisaremos desenvolver uma estrutura nova e aprimorada para viver.
Para ter certeza, precisaremos mudar o paradigma das nossas vidas. Isso significa que precisaremos ver as coisas de maneira diferente e fazer as coisas de maneira diferente para obter um resultado diferente. Em contraste com outros relacionamentos, que estão em constate mudança, o casamento foi feito para ser permanente, e entender que as responsabilidades no casamento não são prorrogáveis nos ajudará a carpe diem (“aproveitar o dia”) para que possamos tornar nosso casamento uma alta prioridade a cada dia. Isso significa agendar um tempo significativo para passarmos uns com os outros todos os dias.
Mudar-se de um lugar para outro no curso do ministério se torna uma realidade que não pode ser facilmente alterada e é vista como a natureza da besta proverbial do ministério. Eu (Willie), como filho de pastor, mudei-me várias vezes durante minha infância e, como filho de missionário, morei em pelo menos três países antes de entrar na adolescência. Como casal, nós vivemos em quatro estados diferentes nos Estados Unidos, em oito casas diferentes, e tivemos de oito a dez atribuições ministeriais diferentes em três décadas.
Cada mudança foi desafiadora, embora algumas tenham sido mais traumáticas que outras. Mas em cada mudança, experimentamos a mão de Deus e bênçãos que nunca gostaríamos de ficar sem. Como o apóstolo Paulo declara em Filipenses 4:11: “Não estou dizendo isso porque esteja necessitado, pois aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância”.
O FATOR DINHEIRO
Claro, quando se trata de dinheiro, sempre podemos fazer com mais. E, embora os pastores em certas partes do mundo desfrutam de um estilo de vida de classe média ou mesmo classe média alta, especialmente se suas esposas têm bons empregos, em outras áreas do mundo, os pastores sofrem com escassos recursos e salários, e suas esposas não são pagas para trabalhar. E, ainda assim, devemos aprender a confiar no mesmo Deus a quem adoramos se quisermos que nossas vidas no ministério sejam uma benção para os outros. Devemos seguir o exemplo de abnegação de nosso Mestre.
A estabilidade financeira, com certeza, depende tanto de nossa filosofia de mordomia quanto de nossos hábitos de consumo. Como mortais a quem foi confiado o privilégio de conduzir a Palavra de Deus para inspirar e levar pessoas a Ele, que é a vida eterna, nós também precisamos crer que Deus cumpre Suas promessas. Como casais pastorais, precisamos reivindicar as promessas que Deus fez no passado ao Seu povo, que ainda são boas para Seus discípulos hoje. A mensagem de Malaquias 3:10 ainda está em vigor e declara: “‘Tragam o dízimo todo ao depósito do templo, para que haja alimento em minha casa. Ponham-me à prova’, diz o Senhor dos Exércitos, ‘e vejam se não vou abrir as comportas dos céus e derramar sobre vocês tantas bênçãos que nem terão onde guardá-las’”. Deus promete que não faltarão bênçãos se formos fiéis a Ele. Em Mateus 28:20, Jesus promete: “E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos”. Em João 14:27, Jesus promete: “Deixo-lhes a paz; a minha paz lhes dou. Não a dou como o mundo a dá. Não se perturbem os seus corações, nem tenham medo”. E por último, mas não menos importante, em Filipenses 4:19, a promessa é: “O meu Deus suprirá todas as necessidades de vocês, de acordo com as suas gloriosas riquezas em Cristo Jesus”.
CONCLUSÃO
Ao analisarmos novamente a realidade dos casamentos pastorais, precisamos fazê-lo atentos ao fato de que às vezes é mais difícil do que precisa ser, porque nós abordamos esse trabalho altamente espiritual sem os valores espirituais correspondentes que precisam estar presentes para ele funcionar. Como afirmamos, “muitas pessoas hoje entram no casamento com uma noção individualista de realização pessoal em vez de focar da realização do relacionamento. Embora em casamentos saudáveis os casais precisem encontrar um equilíbrio entre ambos, deve haver uma consciência contínua e intencional da alteridade como parte de nossa realidade diária. Não há outra maneira de sobreviver e prosperar, em um relacionamento tão próximo e íntimo como o casamento, sem adotar uma perspectiva que inclua os sentimentos e as opiniões dos outros, no mínimo os sentimentos e opiniões da pessoa que escolhemos como nosso cônjuge”.6
Ao você se comprometer em nutrir seu casamento pastoral hoje e nas próximas semanas, meses e anos, nós encorajamos você a se lembrar da admoestação de Paulo em 1 Coríntios 10:31: “Assim, quer vocês comam, bebam ou façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus”.
Que seu relacionamento com Deus lhe conceda a paciência e a bondade necessárias para dar honra e glória a Deus por meio de seu relacionamento matrimonial. Mais do que esperamos, oramos por isso.
1 Ellen G. White, O Lar Adventista (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004), 70.
2 Todas as referências bíblicas são da Nova Versão Internacional.
3 Ellen G. White, Caminho a Cristo (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira), 100.
4 Daniel Goleman, What Makes a Leader: Why Emotional Intelligence Matters (Florence, MA: More Than Sound, 2013), 10, 11.
5 Stephen R. Covey, The 7 Habits of Highly Effective Families (New York: Golden Books, 1997), 113.
6 Willie and Elaine Oliver, “The Beauty of Marriage” in Marriage: Biblical and Theological Aspects, ed. Ekkehardt Mueller and Elias Brasil de Souza (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 2015), 6.