Finanças Evangélicas: Trabalhando em Harmonia

Finanças Evangélicas: Trabalhando em Harmonia

Frank B. Holbrook

Onde Devo Pagar o Meu Dízimo?

“Para onde enviarei o meu dízimo? Não tenho mais confiança na liderança da Igreja. Posso dá-lo a alguém que afirma pregar ‘o testemunho direto’ da fé adventista? Posso ajudar com ele a entidades de manutenção própria?” Em outras palavras, estou livre, como membro da Igreja, para encaminhar o meu dízimo a qualquer finalidade que achar conveniente? Posso esperar que o Senhor aprove semelhante maneira de proceder?

Estas são perguntas práticas – e sinceras. Infelizmente, refletem a incerteza, entre alguns de nossos membros, a respeito das atribuições e função da Igreja Adventista do Sétimo Dia mundial e organizada. Visto que somos uma igreja baseada na Bíblia, cremos que a experiência de Israel com a organização e o dízimo pode prover bons vislumbres para ajudar os adventistas modernos a resolver tais questões.

Experiência do Antigo Testamento

Começamos o nosso estudo com a experiência de Israel no tempo dos juízes (1400-1050 a. C.), uma época de anarquia. “Naqueles dias não havia rei em Israel: cada um fazia o que achava mais reto” – comentou o cronista (Juízes 21:25). Havia pouca cooperação para o bem comum.

Em contraste com isso, o estabelecimento de uma monarquia trouxe um senso de unidade, consciência nacional e propósito. Trouxe identidade e coerência à fé religiosa e às instituições civis de Israel. Quando os reis de Israel governavam sob a direção de Deus, seguindo o modelo organizacional estabelecido por Moisés, os interesses nacionais eram melhor atendidos, e o povo prosperava tanto espiritual como materialmente. Essa prosperidade constituía um mostruário chamativo, atraindo as nações circunvizinhas para o verdadeiro Deus (ver Deut. 4:5-8). A ordem é a lei do Céu; ela é vista em todas as obras de Deus.

O Sistema de Sustento de Israel

O governo monárquico de Israel, como teocracia, significava que a fé religiosa estava intimamente ligada à vida civil. O divinamente designado plano financeiro do dízimo servia de reforço para a ministração sacerdotal no Templo e para a religião nacional.

A prática de devolver a Deus o dízimo (ou dez por cento) do aumento nos bens materiais aparece como parte definitiva da religião patriarcal desde tempos remotos (ver Gên. 14:20; 28:22). Os patriarcas provavelmente usavam os dízimos em sacrifícios e festas especiais ao Senhor, embora certa vez Abraão desse o dízimo dos despojos de guerra a Melquisedeque, sacerdote do Deus verdadeiro em Canaã.

Por ocasião do estabelecimento da nação, do santuário e do sacerdócio israelitas, Deus reafirmou Seu direito ao dízimo: “Todas as dízimas da terra, tanto do grão do campo, como do fruto das árvores, são do Senhor: santas são ao Senhor. … No tocante às dízimas do gado e do rebanho, de tudo o que passar debaixo da vara do pastor, o dízimo será santo ao Senhor.” Lev. 27:30-32. Agora, porém, o Senhor ordenou que o dízimo deveria constituir a base principal do sustento financeiro da tribo de Levi, a qual, não recebendo território  em Canaã, foi designada para cuidar das necessidades religiosas da nação (Num. 18:21-24).

Os levitas (habitando nas 48 cidades que lhes foram outorgadas em muitas partes dos territórios das tribos – Num. 35:7) periodicamente recolhiam os dízimos do povo. Eles, por sua vez, dizimavam o que recebiam e levavam esses “dízimos dos dízimos” a um depósito no santuário, onde eram redistribuídos aos sacerdotes (e em anos posteriores a outros grupos de levitas) que atuavam nos serviços e no ritual do santuário (ver Num. 18:26-28).

Esse plano financeiro provavelmente não funcionou no período dos juízes; e sabemos que às vezes falhou durante a era monárquica. Mas em períodos de avivamento espiritual, captamos vislumbres de sua vigência. Um deles ocorreu no reinado de Ezequias, de Judá (II Crôn. 31:2-19).

Em atenção à ordem do rei, de que fosse dada a “parte devida aos sacerdotes e levitas” (verso 4), “os dízimos de tudo” (verso 5) começaram a fluir para o depósito do Templo. Azarias, o sumo sacerdote, exclamou para o rei indagador: “Desde que se começou a trazer à casa do Senhor estas ofertas, temos comida e nos temos fartado delas, e ainda há sobra em abundância” (verso 10). Essa notícia animadora impeliu Ezequias a ampliar as áreas de armazenagem e designar oficiais para supervisionar a distribuição regular desse sustento “a seus irmãos [levitas], segundo os seus turnos, assim aos pequenos como aos grandes” (verso 15; ver também versos 11-19).

Quando Neemias – nomeado governador da restaurada nação de Judá (quinto século a. C.) – conduziu os judeus à renovação do seu concerto com Deus (ver Neem. 9:38), ele também os levou a assumirem o compromisso de reavivar o sistema dizimal: “Traríamos … os dízimos da nossa terra aos levitas, pois a eles cumpre receber os dízimos em todas as cidades onde há lavoura. O sacerdote, filho de Arão, estaria com os levitas quando estes recebessem os dízimos, e os levitas trariam os dízimos dos dízimos à casa do nosso Deus, às câmaras da casa do tesouro. … E assim não desampararíamos a casa do nosso Deus” (Neem. 10:37-39; cf. 12:44).

No entanto, durante a ausência temporária de Neemias, de Judá (Neem. 13:6), o desígnio nacional falhou, e o povo resvalou. Por ocasião de seu regresso, Neemias repreendeu os dirigentes da nação, perguntando: “Por que se desamparou a casa de Deus?” (verso 11). Mais uma vez foi restaurado o sistema dizimal, novamente foram nomeados oficiais para supervisionar a distribuição, e “Judá trouxe os dízimos do grão, do vinho e do azeite aos depósitos” (verso 12).

No segundo período de Neemias como governador, Deus desafiou Seu povo por intermédio de Malaquias: “Roubará o homem a Deus? Todavia vós Me roubais, e dizeis: Em que Te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a Mim Me roubais, vós, a nação toda” (Mal. 3:8 e 9). Após essa severa desaprovação, Deus apela mais uma vez para Seu povo: “Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na Minha casa” (verso 10).

Desta recapitulação dos fatos bíblicos, verificamos ser evidente que o culto levítico era amplamente reforçado por um sistema dizimal que funcionava com base num princípio de armazenagem ou depósito. Ninguém escolhia dar o seu dízimo a um sacerdote ou a um grupo de sacerdotes, em particular. Pelo contrário, todos os dízimos de Israel eram reunidos pelos levitas, os quais, por sua vez, levavam o dízimo desses artigos, gêneros alimentícios e dinheiro às áreas de depósito do Templo. Nesse local, oficiais designados distribuíam os meios de subsistência de maneira regular e em quantidades apropriadas, aos sacerdotes e a outros servidores levíticos que ministravam diretamente no ritual do Templo. Essa cooperação nacional provia sustento coordenado ao pessoal do Templo, que dedicava tempo integral aos seus respectivos ministérios espirituais.

Os Adventistas, a Organização e o Dízimo

No começo, os primeiros observadores do sábado relutaram em avançar em direção à organização. Mas, à medida que a mensagem do sábado foi sendo propagada, tornou-se evidente que não poderia haver verdadeiro avanço se “cada um fizesse o que achasse correto”. Ellen White resumiu desta maneira a razão por que nossos pioneiros organizaram a Igreja Adventista do Sétimo Dia, na década de 1860:

“Aumentando o nosso número, tornou-se evidente que sem alguma forma de organização, haveria grande confusão, e a obra não seria levada avante com êxito. A organização era indispensável para prover a manutenção do ministério, para levar a obra a novos campos, para proteger dos membros indignos tanto as igrejas como os ministros, para a conservação das propriedades da igreja, para a publicação da verdade pela imprensa, e para muitos outros fins.” – Testemunhos Para Ministros, pág. 26.

Sendo pressionados a manter os pastores no campo em tempo integral, nossos pioneiros procuraram desenvolver um adequado sistema financeiro para a Igreja que se organizava. Já em 1858, uma classe bíblica, em Battle Creek, sob a direção de J. N. Andrews, começou a buscar princípios bíblicos para o sustento do evangelho. A classe acabou recomendando um plano conhecido como Beneficência Sistemática, o predecessor do atual sistema de dízimos e ofertas.

No entanto, foi somente em 1876-1879 que os adventistas instituíram um sistema dizimal bem desenvolvido (adaptado ao modelo levítico), como base para as finanças denominacionais. Os dirigentes incentivavam os membros a adotar o plano dizimal como providência ordenada por Deus para o sustento do ministério e a obra da Igreja. Os dízimos recolhidos nas igrejas eram remetidos às associações, para o sustento dos pastores em seus respectivos territórios. A associação era designada como a “casa do tesouro” para os dízimos. Por sua vez, a associação transferia o dízimo desses dízimos à Associação Geral. No decorrer dos anos, esse princípio da “casa do tesouro” tem sido aprimorado, de modo que o dízimo flui agora das igrejas locais para a associação, que transfere certa porcentagem para a União, e esta para a Associação Geral, a qual supervisiona o campo mundial.

O constante desenvolvimento e ampliação da Igreja Adventista do Sétimo Dia – de 3.500 membros nos Estados Unidos, em 1863, para mais de 5 milhões no mundo todo, hoje em dia [quando este artigo foi escrito]; e de uma pequena região dos Estados Unidos, para a presença em mais de 180 países – tem demonstrado, sob a bênção de Deus, a solidez do princípio da “casa do tesouro”, do sistema levítico. A Igreja é bem-sucedida quando avança em conjunto para um objetivo comum.

Entidades de Manutenção Própria e a Obra Organizada

Aproximadamente 40 anos após a organização da Igreja Adventista, apareceu uma nova forma de empenho da parte dos membros: a entidade de manutenção própria. Iniciada em 1904, a Companhia Agrícola e do Instituto Normal de Nashville (a organização que deu origem à Universidade Madison e ao Hospital Madison) tornou-se a precursora de dezenas de entidades similares que ajudaram a desenvolver a obra no Sul dos Estados Unidos. Hoje, cerca de 700 entidades de manutenção própria e empresas independentes, com objetivos semelhantes aos da Companhia Madison, funcionam sob a tutela da ASI (Adventist-Laymens’s Services and Industries International) – organização ligada à Associação Geral.

Em geral, as entidades de manutenção própria consideram-se como estando ligadas à Igreja organizada. Na realidade, é a própria Igreja Adventista que constitui a razão de sua existência. Compostas de dedicados e abnegados homens e mulheres, as entidades de manutenção própria têm ampliado e promovido a causa da verdade, no decorrer dos anos, por uma variedade de meios, como escolas e atividades médico-missionárias.

Certamente, a intenção nunca foi que as entidades de manutenção própria gastassem as energias volvendo-se contra a Igreja, para desafiar publicamente suas doutrinas, criticar seus empenhos ou arrebatar seus dízimos. Pelo contrário, a intenção era que tais entidades enaltecessem a Igreja e dilatassem sua influência, como Arão e Hur, que sustiveram as mãos de Moisés na batalha de Israel contra os amalequitas (Êxo. 17:8-16).

Infelizmente, alguns ministérios independentes (não sob a tutela da ASI) aceitam abertamente recursos do dízimo de membros da Igreja e afirmam que o princípio da “casa do tesouro” é nulo. Do mesmo modo que as pessoas dissidentes que abandonaram a fé adventista, os dirigentes desses ministérios apontam para as falhas e imperfeições na Igreja como razões para os membros entregarem os seus dízimos a eles – embora não sejam responsáveis a pessoa alguma. Esses grupos independentes às vezes apelam para o exemplo de Ellen White, como justificativa para aceitarem o dízimo do Senhor.

Ellen G. White e o Dízimo

Como um dos pioneiros, Ellen White incentivou a organização da Igreja Adventista e apoiou plenamente, pelo ensino e pela prática, o sistema dizimal, de acordo com o plano da “casa do tesouro”. Nos primeiros anos, antes que existissem planos médicos e de aposentadoria, ela (por orientação do Senhor) ocasionalmente ajudou pastores (tanto negros como brancos), que estavam em grandes dificuldades, com o seu dízimo pessoal. Em uma outra situação, ela advertiu um presidente de associação, para que não fizesse caso da doação do dízimo de alguns membros de seu território para a Sociedade Missionária do Sul, que supervisionava a penosa obra nos estados sulinos dos Estados Unidos. Por fim, tornou-se uma prática regular que associações fortes partilhassem certa porcentagem do seu dízimo com associações mais fracas. (Para um relato pormenorizado do emprego do dízimo de Ellen White, ver o livro de Arthur L. White: Ellen White:The Early Elmshaven Years, págs. 389-397.)

Nenhuma dessas exceções deve servir de base para os membros desviarem o dízimo do Senhor, da finalidade a que se destina, para ministérios independentes ou entidades de manutenção própria. Ellen White tratou das questões formuladas no começo deste artigo, pois elas também foram suscitadas em seu tempo.

“Ninguém se sinta na liberdade de reter o dízimo, para empregá-lo segundo seu próprio juízo. Não devem servir-se dele numa emergência, nem usá-lo segundo lhes pareça justo, mesmo no que possam considerar como obra do Senhor. …

“Alguns se têm sentido mal-satisfeitos, e dito: ‘Não devolverei mais o dízimo; pois não confio na maneira por que as coisas são dirigidas na sede da obra.’ Roubareis, porém, a Deus, por pensardes que a direção da obra não é correta? Apresentai vossa queixa franca e abertamente, no devido espírito, e às pessoas competentes. Solicitai em vossas petições que se ajustem as coisas e se ponham em ordem; mas não vos retireis da obra de Deus, nem vos demonstreis infiéis porque outros não estejam fazendo o que é correto.” – Testimonies, vol. 9, págs. 247-249.

“Lede o livro de Malaquias. … Não podeis ver que, em quaisquer circunstâncias, o melhor não é reterdes os vossos dízimos e ofertas por não concordardes com tudo o que vossos irmãos fazem? … Ministros indignos podem receber alguns dos recursos angariados desse modo, mas alguém ousaria, por causa disso, retê-los do tesouro e incorrer na maldição de Deus? Eu não ousaria. Eu pago os meus dízimos com prazer e voluntariamente, dizendo como Davi: ‘Das Tuas mãos To damos’.”

“Não cometais, porém, vós mesmos, algum pecado, retendo de Deus o que Lhe pertence. … Não aumenteis nossas dificuldades financeiras por vossa negligência do dever.” – Special Testimonies, Series A, no 1, págs. 52 e 53.

Nosso Desafio Global

Os adventistas do sétimo dia reconhecem a boa obra que outros cristãos estão realizando. No entanto, estamos comprometidos com a orientação divina que ocasionou o nascimento e a organização do Movimento Adventista, para cumprir a missão simbolizada pelos anjos de Apocalipse 14:6-14 e 18:1-4.

Conquanto a verdade seja perfeita em Jesus, nem a liderança nem os membros deste movimento são perfeitos. O trigo sempre estará mesclado com o joio (ver Mat. 13:24-30 e 36-43); a Igreja sempre terá os seus Judas. Mas as profecias não prenunciaram que viriam novas organizações, nem mais “anjos” a voar. Este é “o tempo do fim”. O atual Movimento do Advento foi designado para realizar essa missão delineada no Apocalipse. Nosso encargo urgente não deixa espaço para tentativas desorganizadas e movimentos a esmo, em que cada qual faça o que seja correto aos seus próprios olhos. Só há um lugar para depositar os dízimos do Senhor: a “casa do tesouro” da Igreja. Para os adventistas, não é admissível outro emprego do dízimo.

Deus espera que Seu povo se una espiritualmente, e avance financeiramente em harmonia, para realizar os Seus objetivos. A tarefa global da Igreja é muitas vezes maior do que a do antigo Israel ao comprometer-se com o Templo. Com um tão grande desafio diante de nós, que todo pastor e membro participe, de todo o coração, do espírito de Neemias: “Não desampararemos a casa do nosso Deus” (Neem. 10:39).