Daniel Goleman, PhD e Richard Boyatzis, PhD
Em 1988, Daniel Goleman publicou seu primeiro artigo sobre inteligência emocional e liderança. A resposta a “O Que Faz Um Líder” foi entusiástica. Pessoas da comunidade de negócios inteira começaram a falar sobre o papel vital que a empatia e o conhecimento próprio desempenham numa liderança efetiva. O conceito de inteligência emocional continua a ocupar um espaço proeminente na literatura sobre liderança e em programas de treinamento. Entretanto, nos últimos cinco anos, a pesquisa na área da neurociência social (estudo do que acontece no cérebro durante a inter-relação mútua), uma area que está em desenvolvimento, está começando a revelar novas verdades sutis sobre o que um bom líder produz. A descoberta em destaque é que, algumas coisas que os líderes fazem, especificamente o fato de mostrar empatia e se conectar com o humor dos outros, afetam literalmente o cérebro deles e também o cérebro dos seus sectários/seguidores. Na verdade, os pesquisadores têm estabelecido que essa dinâmica de líder-sectário/seguidores não é uma questão de cérebros individuais reagindo um ao outro conscientemente e inconscientemente. A mente de dois indivíduos se torna uma só mente, incorporadas num único sistema.
Acreditamos que os grandes líderes são aqueles cujo comportamento potencializa poderosamente o sistema cerebral de interconectividade. Nós os colocamos no lado oposto, em termos da dinâmica regional do cérebro, das pessoas com severos distúrbios sociais, como Autismo ou Síndrome de Asperger, que são caracterizados por subdesenvolvimento nas áreas cerebrais associadas às interações sociais.
Se estivermos corretos, uma maneira eficiente para se tornar um líder melhor é: encontrar contextos autênticos nos quais seja possível aprender que tipo de comportamento social fortalece a parte do cérebro responsável pelas interações sociais (o circuito social do cérebro). Em outras palavras, uma liderança eficaz tem menos a ver com o controle, domínio de certas situações ou até mesmo o domínio de várias qualidades sociais, e mais com o desenvolvimento de interesse e talento genuínos para nutrir sentimentos positivos nas pessoas que você precisa de suporte e cooperação.
A ideia de que uma liderança eficaz está mais relacionada com a presença de potentes circuitos sociais no cérebro nos levou a estender nosso conceito de inteligência emocional, que foi baseado nas teorias de psicologia individual.
Inteligência Social é um modelo para avaliar a liderança, que é baseado mais em relacionamentos. Nós a definimos como um conjunto de atitudes interpessoais estabelecidas em circuitos neuronais específicos (e sistemas endócrinos relacionados) que inspiram outros a serem eficazes.
O conceito de que líderes precisam de habilidades sociais com certeza não é novo. Em 1920, Edward Thorndike, um psicólogo da Columbia University, mencionou que “o melhor mecânico de uma fábrica poderia não se suceder bem como patrão por falta de inteligência social”. Recentemente, nosso amigo Claudio Fernández-Aráoz, ao analisar novos executivos nível C, descobriu que aqueles que foram contratados devido à própria disciplina, determinação e intelecto foram, algumas vezes, demitidos mais tarde por falta de atitudes sociais básicas. Em outras palavras, as pessoas que Fernández- Aráoz estudou tinham inteligência e “ferramentas”, mas a incapacidade deles de lidarem um com o outro no ambiente de trabalho foi o que causou o dano profissional.
A novidade em nossa definição de inteligência social é a base biológica que ela tem e que vamos explorar nas próximas páginas. Mostraremos como integrar informações recentes sobre neurônios espelhos, células fusiformes e oscilantes com um comportamento prático e socialmente inteligente que reforça as conexões neuronais entre você e as pessoas que lhe seguem. Esses conceitos estão baseados nos trabalhos de neurocientistas, em nossa própria pesquisa, em trabalhos como consultor e nas descobertas de pesquisadores associados com o “Consórcio para Pesquisa sobre Inteligência Social em Instituições”.
Os líderes são um espelho para aqueles que os seguem. Estes refletem seus líderes, literalmente. A descoberta mais espetacular na área da neurociência do comportamento talvez seja a identificação de neurônios espelhos em áreas bem separadas e distintas no cérebro. Eles foram descobertos por acaso por neurocientistas italianos enquanto monitoravam uma célula no cérebro de um macaco. Essa célula só disparava quando o macaco levantava o braço. Um dia, um técnico do laboratório levantou um cone de sorvete em direção à sua boca, esse movimento ativou a mesma reação na célula do macaco. Essa foi a primeira evidência que o cérebro está cheio de neurônios que imitam ou refletem o que outro ser faz. Essa classe de neurônios, até então não conhecida, funciona como uma Wi-Fi neural que nos permite navegar em nosso mundo social. Quando detectamos as emoções de outra pessoa através das suas ações, seja consciente ou inconscientemente, nossos neurônios espelhos reproduzem essas emoções. Juntos, esses neurônios produzem uma sensação instantânea de uma experiência mútua.
Neurônios espelhos têm uma importância essencial em instituições, pois as ações e as emoções de um líder induzem aqueles que o seguem a refletir aquelas atitudes e ações. Os resultados da ativação dos circuitos neuronais nos cérebros das pessoas que lhe seguem podem ser esplêndidos. Num estudo recente, Marie Dasborough, uma colega nossa, observou dois grupos, um recebeu um comentário negativo e em seguida um sinal emocional positivo, como sorrisos e um aceno com a cabeça. O outro grupo recebeu um comentário positivo que foi dado com criticismo e olhar carregado.
Nas entrevistas que se seguiram para avaliar o estado emocional dos dois grupos, as pessoas que receberam um comentário positivo seguido de sinais emocionais negativos se sentiram pior com relação ao desempenho deles do que os participantes do outro grupo que receberam comentário negativo de uma forma amigável. De fato, a forma como o comentário foi dado foi mais importante do que o comentário em si.
Todos sabem que quando as pessoas se sentem melhor, trabalham melhor. Então, se os líderes esperam obter o melhor possível da sua equipe, eles deveriam continuar sendo exigentes, mas de uma maneira que promovesse um bom humor, disposição na sua equipe.
O velho método castigo, recompensa, sozinho, não faz sentido neural. As formas tradicionais de incentivo não são suficientes para produzir um melhor desempenho.
Daremos um exemplo do que realmente acontece. Existe um subgrupo de neurônios espelho cujo único trabalho é detectar os sorrisos e risadas de outras pessoas, promovendo sorrisos e risadas em outros, em retorno. Um chefe que tem controle próprio, mas não tem bom humor, raramente vai se conectar com os neurônios dos membros da equipe dele; mas um chefe que ri e estabelece uma atmosfera amigável, coloca esses neurônios pra funcionar, ativando risadas e conectando a sua equipe ao mesmo tempo.
Fabio Sala mostrou em sua pesquisa que um grupo unido é um grupo que tem um bom desempenho. Ele descobriu que os líderes que possuem o melhor desempenho são capazes de extrair risadas dos seus subordinados três vezes mais do que aqueles líderes de desempenho médio. Outras pesquisas têm demonstrado que estar de bom humor ajuda as pessoas a absorverem informação eficientemente e a responder com criatividade. Em outras palavras, risada é um negócio sério.
Isso com certeza fez uma diferença em um hospital-universidade de Boston. Dois doutores, nós os chamaremos de Dr. Burke e Dr. Humboldt, estavam competindo pelo posto de chefe executivo da corporação que é responsável por esse e outros hospitais. Os dois eram chefes de departamento, médicos excelentes e tinham muitos artigos publicados em jornais médicos de prestígio. No entanto, os dois tinham personalidades muito diferentes.
Burke era ardente, sempre com foco no que ele tinha que fazer e era impessoal. Um perfeccionista implacável, que mantinha sua equipe em estado de alerta. Humboldt também era muito exigente, mas era mais fácil de lidar e até mesmo fazia brincadeiras com os empregados, colegas de trabalho e pacientes. No departamento de Humboldt, as pessoas sorriam e faziam gracejos mais do que no departamento do Burke. Pessoas talentosas frequentemente saiam do departamento de Burke. Em contraste, pessoas proeminentes se mudavam para o ambiente do Humbdolt, que era mais confortável. O hospital reconheceu que o estilo de liderança de Humboldt era socialmente inteligente e o escolheu como o novo chefe executivo.
Um líder perfeitamente afinado
Executivos famosos sempre falam sobre como liderar por instinto. Na verdade, ter bom instintos é geralmente reconhecido como uma vantagem para um líder em qualquer contexto, seja em reconhecer o humor de uma instituição ou em conduzir uma negociação delicada com um competidor.
A intuição também é produzida no cérebro, em parte, por uma classe de neurônios chamados células fusiformes (células spindles). Esse nome é devido ao formato delas. Essas células são quatro vezes maior que as outras células do cérebro e uma ramificação extralonga para facilitar o contato com outras células e, ao mesmo tempo, transmitir pensamentos e sentidos mais rapidamente. Essa conexão de emoções, crenças e juízos extremamente rápida cria o que cientistas do comportamento chamam de sistema de direção social. Células fusiformes ativam redes neurais que desempenham esse papel toda vez que temos que escolher a melhor resposta entre várias opções, até mesmo para coisas triviais como uma lista de coisas para fazer. Essas células também nos ajudam a avaliar se uma pessoa é de confiança, ou se é a pessoa certa para determinada função. Nossas células fusiformes disparam num vigésimo de segundo as informações que nos falam como nos sentimos com relação àquela pessoa. Essas conclusões de num “piscar de olhos” podem exatas, e foram examinadas por medidas métricas.
Esse tipo de “afinidade” é física, literalmente. As pessoas que seguem um líder estão sujeitas a uma união com ele – ou a o que nós e nossa colega Annie McKee chamamos de “ressonância”. A maior parte desses sentimentos acontecem inconscientemente, graças ao circuito dos neurônios espelhos e das células fusiformes. Mas, outra classes de neurônios também está envolvida: os neurônios osciladores coordenam as pessoas fisicamente via regulação de quando e como o corpo dessas pessoas se movem juntos.
Você pode observar os neurônios osciladores funcionando quando você vê pessoas que estão a ponto de se beijar, o movimento delas é como uma dança, um corpo respondendo ao outro sem nenhum esforço. Essa mesma dinâmica ocorre quando dois violoncelistas tocam juntos. Eles não apenas tocam as notas em uníssono, mas também graças aos neurônios osciladores, os hemisférios direito do cérebro dos dois músicos estão mais intimamente coordenados do que o lado esquerdo do cérebro deles.
Disparando seus neurônios sociais
O disparo dos neurônios sociais é uma coisa evidente. Certa vez, analisamos um vídeo de Herb Kelleher, o cofundador e ex-chefe executivo da Southwest Airlines , passeando pelos corredores do Love Field , um centro da empresa em Dallas. Nós praticamente o vimos ativar os neurônios espelhos, osciladores e outros circuitos sociais ao ele encontrar cada pessoa no corredor. Ele ofereceu sorrisos radiantes, apertou a mão dos clientes enquanto lhes falava o quanto os apreciava. Abraçou os empregados e lhes agradeceu pelo bom desempenho deles. Herb recebeu de volta exatamente o mesmo que ele ofereceu. A face de uma aeromoça brilhou quando ela se deparou com o chefe. Ela exclamou expressões de carinho e com uma abundância de calor humano e lhe deu um grande abraço. Mais tarde, ela explicou: “Todo mundo se sente como família ao redor dele”.
Infelizmente, não é fácil se transformar em um Herb Kelleher ou em um Dr. Humboldt se você já não for um deles. Sabemos que não existe uma maneira específica para fortalecer os neurônios espelhos, fusiformes e osciladores. Milhões deles são ativados por segundo, durante qualquer encontro. A maneira exata como eles disparam ainda é obscura. Além disso, tentativas feitas conscientemente para ativar a inteligência social sempre têm um efeito negativo, tipo o tiro que sai pela culatra. Quando você tenta, conscientemente, coordenar movimentos com outra pessoa, os neurônios osciladores não são os únicos a disparar. Nesse tipo de situação, o cérebro usa outros circuitos, menos competentes, para iniciar e direcionar os movimentos; o resultado é a interação forçada.
A única maneira para desenvolver eficientemente seu circuito social é através da árdua tarefa de mudra o seu comportamento (leia “Primal Leadership: The hidden driver of great performance ”, nosso artigo no HBR, em dezembro de 2001, com Annie McKee). As empresas que estão interessadas em melhoras na liderança necessitam começar com uma avaliação do desejo que os indivíduos têm de começar um programa de mudança. Os candidatos que desejam essa mudança deveriam construir primeiro uma visão pessoal dela e então iniciar uma avaliação diagnóstica completa, semelhante a uma avaliação médica, para identificar os pontos fortes e os fracos. Com os resultados em mãos, o aspirante a líder pode ser treinado em áreas específicas em que o desenvolvimento de melhores atitudes sociais traria o maior benefício. O treinamento variaria desde uma prática de melhores formas de interagir e aplicação dessas formas em cada oportunidade dada até a observação da prática por um instrutor e comentários sobre o que ele observa, bem como instrução direta com uma pessoa que possa servir como um exemplo. As opções são muitas, mas o caminho para o sucesso é sempre difícil.
Na próxima edição mostraremos como se tornar mais inteligente socialmente e como medir sua inteligência social. Também lhe ajudaremos a definir se você é um líder socialmente inteligente.
Tradução de Marta B. Santos. Ela é correspondente científica da Foco na Pessoa, doutoranda na UIC (Chicago, USA), com pesquisa na área da Neurociência.
Daniel Goleman ([email protected]) é co-presidente do Consórcio para Pesquisa Sobre Inteligência Emocional em Organizações, com sede na Escola de Pós-graduação de Psicologia Aplicada e Profissional da Universidade Rutgers, New Jersey. Ele é autor dos best-sellers “Inteligência Emocional” e “Inteligência Social: A Nova Ciência dos Relacionamentos Humanos”.
Richard Boyatzis ([email protected]) é titular da cátedra H. R. Horvitz Chair of Family Business e professor nas áreas de comportamento organizacional, psicologia e ciência cognitiva da Case Western Reserve University, em Cleveland. Ele é coautor, com Annie McKee e Frances Johnston, de “Becoming a Resonant Leader” (Harvard Business Press, 2008).