O ministério desenvolvido por Tiago e Ellen White é um modelo a ser imitado pelos casais pastorais modernos
Poucos dias antes do que seria o sexagésimo aniversário de casamento de Ellen G. White, ela relembrou com carinho a pessoa de Tiago White, seu falecido esposo: “Casamo-nos e assim estamos desde então. Apesar de estar morto, em minha opinião ele foi o melhor homem deste mundo. A despeito do que [as pessoas] possam dizer… em minha viuvez, eu não uniria minha vida com mais ninguém. Sinto… que devo preservar a memória de meu esposo.”[1]
Provavelmente, Tiago e Ellen tivessem se encontrado pela primeira vez no verão de 1844. Ambos eram adventistas mileritas, que ansiosamente aguardavam a vinda de Cristo naquele ano. Apesar de sua saúde, Ellen falava em reuniões e testemunhava de sua fé. Tiago era um jovem pregador entusiasta que, em uma turnê evangelística de quatro meses, num período de pesadas nevascas no início de 1843, levou mil pessoas à conversão.[2] Em relação às suas crenças, os dois tinham muito em comum.
Poucas semanas após 22 de outubro de 1844, depois da frustrada esperança da vinda de Jesus, Ellen recebeu sua primeira visão. Não se sabe exatamente quando foi que Tiago ouviu pela primeira vez a respeito dela. No entanto, ele logo se uniu ao grupo de amigos que acompanhavam Ellen nas viagens para testemunhar sobre as visões.
No dia 30 de agosto de 1846, Tiago Spinger White, 25 anos, e Ellen Gould Harmon, 18 anos, se casaram diante de Charles Harding, juiz de paz em Portland, Maine.[3] Esse foi o início de quase 35 anos de parceria que terminou com a morte de Tiago, no dia 6 de agosto de 1881.
Vida de casados
Como recém-casados, Tiago e Ellen começaram a vida em Gorham, Maine, morando com Robert e Eunice Harmon, pais de Ellen. Eles ainda moravam ali quando ela deu à luz seu primeiro filho, Henry Nichols, em 1847. Os White tiveram mais três filhos: James Edson, em 1849, William Clarence, em 1854, e John Herbert, em 1860. Somente o segundo e o terceiro filhos sobreviveram até a idade adulta.
Durante alguns anos, Tiago e Ellen viajaram por toda a Nova Inglaterra, o estado de Nova York e Canadá, realizando reuniões e incentivando a fé dos novos conversos. Devido às condições primitivas das viagens naquele tempo, eles deixaram o filho mais velho, Henry, aos cuidados de uma família de amigos adventistas, Stockbridge Howland, por cinco anos, em Topsham, Maine.[4]
Publicações
No fim de 1848, em visão, Deus instruiu Ellen G. White no sentido de que seu esposo devia iniciar a publicação de uma revista.[5] Somente no mês de julho do ano seguinte, Tiago, que não tinha dinheiro e era de pouca educação formal, conseguiu lançar o primeiro jornal da nascente igreja com o título de The Present Truth [A Verdade Presente].[6] Essa não foi a primeira vez que Deus falou através de Ellen para promover o avanço da jovem igreja. Embora nem sempre soubesse qual era a melhor forma de agir, tanto quanto sabemos Tiago nunca respondia: “Não! Outra visão, não!” Ao contrário, ele sempre foi o herói de sua esposa, seu defensor e editor.
Com o passar do tempo, The Present Truth deu lugar à Advent Review and Sabbath Herald [Revista Adventista e Arauto do Sábado], hoje conhecida como Adventist Review [Revista Adventista]. Mais uma vez, Ellen apoiou o novo empreendimento. Certa vez, quando Tiago chegou em casa, totalmente desanimado por não ter dinheiro suficiente para publicar a edição seguinte da revista, ela lhe entregou uma meia, cheia de moedas que havia cuidadosamente poupado para uma emergência posterior. Ali havia exatamente o suficiente para a publicação.[7]
Dificuldades
Em 1852, Tiago e Ellen se mudaram para Rochester, Nova York. A qualidade de vida era bem primitiva, mas eles continuavam trabalhando juntos para o avanço da igreja. Alugaram uma casa por 175 dólares anuais. A vida do casal não era fácil. Na sala de estar abrigavam a nova máquina impressora. Vários dos jovens que ali trabalhavam também moravam com eles.
De Rochester, os White se mudaram para Battle Creek, Michigan, em 1855, onde compraram sua primeira casa. Durante os anos seguintes, continuaram trabalhando juntos. Tiago pregava pela manhã e Ellen falava à tarde. Às vezes, eram desafiados por críticas de membros da igreja. Na verdade, até os filhos, especialmente o segundo, Edson, foi grande desafio para eles. Muitas vezes, Ellen era mediadora entre o pai e o filho. A personalidade rebelde de Edson contrastava com a do irmão mais novo, William, que tendia a ser mais obediente.
A partir de 1865, Tiago White sofreu pelo menos cinco derrames.[8] Todas as vezes em que isso aconteceu, Ellen fez tudo o que lhe foi possível para que o esposo se recuperasse. Quando o tratamento do instituto de saúde em Dansville, Nova York, para o qual ela o havia levado, divergiu do que ela achava que ele precisava, ela o levou de volta para casa, em Battle Creek.[9]
Mais tarde, foram para Greenville, Michigan. Não querendo que Tiago ficasse inativo, Ellen pediu aos vizinhos que, quando ele pedisse ajuda para recolher o feno, eles dissessem que estavam muito ocupados para ajudá-lo. Ellen carregava a carroça com o feno enquanto Tiago arriava e conduzia a parelha de cavalos.[10] Algum tempo antes, ela havia feito uma trilha na neve com os pés, para que ele pudesse caminhar seguindo suas pegadas.[11] Lentamente, Tiago recuperou a saúde. Ela ficou muito feliz quando, outra vez, ele pôde voltar ao púlpito para pregar.
Trabalhando juntos
Ao longo dos anos, os dois sempre oravam juntos e às vezes até escolhiam um bosque perto de casa para momentos de oração em conjunto. Eram generosos na doação de recursos. Em 1885, Ellen declarou que ela e Tiago haviam doado trinta mil dólares para a causa de Deus.[12] Viajavam a cavalo, de charrete, bote, diligência e várias vezes cruzaram de trem os Estados Unidos. Falavam em escolas, tendas, bosques, igrejas, celeiros, reuniões campais e nas casas das pessoas. Também fundaram instituições, escreveram artigos para as revistas que Tiago havia iniciado e até acamparam juntos no Colorado. Logo no início, quando paravam para comer, às vezes Tiago escrevia artigos usando a aba do chapéu como escrivaninha, enquanto Ellen preparava a refeição.
Embora nem sempre concordassem em tudo, o amor e o respeito de um pelo outro, somados ao objetivo comum de preparar pessoas para o encontro com Jesus, superava tudo. Entretanto, quando Tiago teve a ideia de liderar uma caravana de carroças do Texas ao Colorado, em 1878, Ellen não ficou feliz. Porém, apesar de suas reservas, ela o acompanhou para arrumar as camas, todas as noites, e preparar as refeições. Mesmo assim, as chuvas torrenciais dificultaram a viagem para todos.[13]
A música era parte importante do ministério compartilhado pelo casal White. Geralmente, em sua casa, cantar era parte dos cultos em família. Tiago compilou quatro dos primeiros hinários usados pelos pioneiros adventistas.[14] Certa ocasião, enquanto estava presidindo uma assembleia da Associação Geral, diante de uma dificuldade e no intuito de animar as pessoas, Tiago convidou a esposa e, juntos, cantaram um dueto que alcançou o propósito estabelecido.[15] Em vários aspectos, eles faziam um trabalho em equipe.
Novos desafios
Entre 1847 e 1876, Tiago sofreu vários derrames cerebrais. Eles alteraram em muito seu humor, tanto que ele decidiu ir sozinho a uma viagem de palestras, enquanto Ellen ficou em casa, em Oakland, Califórnia.[16]
Embora ela não compreendesse exatamente a causa desse comportamento do esposo, suas cartas revelam uma mulher que o amava muito. Tiago tinha grande consideração pelas mensagens que Deus, às vezes, enviava a ele por meio de sua esposa. De fato, após admoestá-la por carta, para que ela não mais lhe escrevesse meros conselhos de esposa, disse-lhe que, se Deus lhe enviasse uma mensagem para ele, ela deveria comunicar a ele. Por estar tremendamente enfermo naquele tempo, Tiago reconhecia sua profunda necessidade da ajuda divina. Por essa razão não desejava que sua esposa omitisse nenhuma mensagem especial para ele. Mesmo assim, nos anos seguintes e até a morte dele, em várias ocasiões diferentes Tiago e Ellen concluíram que seria melhor trabalharem separadamente, seguido de períodos de esforços combinados.
Apesar do comportamento excêntrico de Tiago, resultante dos derrames, seu amor pela esposa jamais vacilou. Em 1874, ele recomendou que o filho Willie desse à mãe o que ela precisasse. “Tenha o mais terno cuidado para com sua querida mãe… Não concorde com suas ideias de economia, levando-os a sofrer privações.” Sempre generosa com outros, Ellen era bem econômica quando precisava gastar dinheiro consigo mesma.[17] Entretanto ela também expressava preocupação e carinho por Tiago. Em 1878, quando o deixou de férias no Colorado, enquanto participava de algumas reuniões campais, ela escreveu para ele: “Podemos escrever no inverno. Deixe isso de lado agora. Livre-se de todo fardo e se torne um garoto despreocupado outra vez… Faça caminhadas, acampe, pesque, cace, vá a lugares em que nunca esteve antes, descanse e desfrute de tudo. Volte, então, revigorado para o trabalho.”[18]
Aproximadamente um ano antes da morte de Tiago, que aconteceu num sábado à tarde,[19] ele escreveu sobre Ellen: “Ela tem sido minha coroa de regozijo…”[20] Vítima de malária, Tiago morreu quatro dias após seu aniversário de 60 anos. Quando alguém sugeriu a Ellen que um monumento de uma coluna quebrada fosse usado para representar a vida de seu esposo, ela recusou, pois achava que isso desonraria suas notáveis realizações.[21] Eles resistiram às tempestades da vida, e nada além da morte quebraria sua união. Hoje, 131 anos depois da morte de Tiago White, seu casamento com Ellen ainda é um exemplo de serviço para a igreja que ajudaram a estabelecer.
Referências:
1 Interview with Mrs. E. G. White, RE Early Experiences, 13/08/1906, Patrimônio Literário de Ellen G. White, document 733c.
2 James White, Life Incidents, in Connection With the Great Advent Movement, as Illustrated by the Three Angels of Revelation 14 (Battle Creek, MI: Steam Press Seventh-day Adventist Pub. Ass., 1868), v. 1, p. 96.
3 Certidão de Casamento de Tiago e Ellen G. White, Patrimônio Literário de Ellen G. White, Associação Geral da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
4 Arthur L. White, Ellen G. White: The Early Years, 1827-1862 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 1985), p. 153.
5 Ellen G. White, Life Sketches of Ellen G. White (Mountain View, CA: Pacific Press, 1915), p. 125.
6 Arthur L. White, Op. Cit., p. 167.
7 Ibid., p. 272.
8 Gerald Wheeler, James White, Innovator and Overcomer (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2003), p. 216.
9 Arthur L. White, Ellen G. White: The Progressive Years, 1862-1876 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 1986), p. 118-127.
10 Ibid., p. 166, 167, 172, 186, 188, 189.
11 Ibid., p. 161.
12 Manuscritos de Ellen G. White 35, 1885.
13 Arthur L. White, Ellen G. White: The Lonely Years, 1876-1891 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 1984), p. 107-112.
14 Virgil Robinson, James White (Washington, DC: Review and Herald, 1976), p. 146.
15 William A. Spicer, Pioneer Days of the Advent Movement (Washington, DC: Review and Herald, 1941), p. 163, 164.
16 Arthur L. White, The Progressive Years, p. 442-445.
17 James White para W. C. White, 05/07/1874, em Arthur L. White, The Progressive Years, p. 439, 440.
18 Ellen G. White para James White e filhos, Carta 1, 1878, em Arthur L. White, The Lonely Years, p. 94, 95.
19 Telegrama de Dr. L. H. Kellogg para William C. White, documento 720 do Patrimônio Literário de Ellen G. White.
20 Life Sketches: Ancestry, Early Life, Christian Experience, and Extensive Labors of Elder James White and His Wife, Ellen G. White (Battle Creek, MI: Steam Press, 1880), p. 126.
21 Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, v. 1, p. 105.